Periféricos é uma série estilosa, detalhista e anacrônica

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Periféricos (2022) é a nova grande produção da Amazon Studios que vem ganhando espaço nos últimos dias e provocado muita reflexão em poucos episódios.

A Prime Video trouxe mais uma produção pesada e muito bem investida, com uma equipe talentosíssima e experiente (como os roteiristas Scott B. Smith e Jamie Chan) para trabalhar em vários episódios baseados no livro homônimo de William Gibson. Com muita sutileza e minuciosidade, cenas vibrantes de ação e verdadeiros espetáculos de CG, a série consegue captar a essência da ficção científica, enquanto forte gênero das telinhas e telonas, com muita elegância e inteligência. Dispondo de alguma paciência e muito tempo, certamente Periféricos vai te agradar e/ou surpreender.

Em episódios longos (cerca de 1 hora cada), a série ocupa muito bem cada cena e consegue prender a pessoa espectadora a quase todo momento de diálogos obtusos e a cenas de ação alucinantes. 

Confira a seguir o que achamos da série até agora.

Tensas realidades

Flynne e Burton Fisher (Chlöe Grace Moretz e Jack Reynor, respectivamente) são irmãos e vivem no interior de Virginia, EUA, numa pequena cidade dos Apalaches. Ambos se ajudam bastante no dia a dia, inclusive nos videogames, hobby que compartilham desde a infância (e que hoje usam profissionalmente). Flynne também ganha a vida com impressões 3D ilegais e faz de tudo para proteger o irmão e ajudar a mãe que está com glioma, um tumor maligno que se inicia no cérebro e a deixa cega aos poucos.

Baseada no livro homônimo de William Gibson, a premissa da série é a de que Flynne dê suporte ao irmão num mundo virtual criado para prever o futuro de Londres e, logo, o futuro da humanidade. Tudo isso para ganharem seu sustento e, logo, ajudem sua mãe juntos. 

A história se passa, entretanto, em um mundo real que acaba de passar por uma grande guerra novamente e, mesmo que numa pequena cidade, seus cidadãos aparentam ser bastante hostis. O lugarejo também reflete uma sociedade decadente, onde o Estado é pouco presente (há apenas um xerife na cidade, com pouca força jurídica e representativa: Ossian, interpretado por Julian Moore-Cook) e existem conflitos constantes entre gangues e grupos distintos que apoiam ou não empresas em esquemas criminosos. Sinistro…

Imagem de periféricos (prime video) - flynne fisher (chloë grace moretz) em diálogo com wilf netherton (gary carr) (reprodução/amazon studios)
Flynne Fisher (Chloë Grace Moretz) em diálogo com Wilf Netherton (Gary Carr) (Reprodução/Amazon Studios)

As atividades virtuais são financiadas por grandes corporações, análogas às big techs que conhecemos bem hoje, e funcionam via um dispositivo neural externo, muito avançado para a época em que existe (2032). Repleta de personagens secundários, a série se desenvolve a partir de situações de conflito intenso dos interesses da família Fisher e seus aliados e as grandes corporações capitalistas e seus asseclas (pessoas que fazem de tudo pelo dinheiro oferecido e se alimentam constantemente do crime e da exploração de gente honesta). 

Estéticas completamente sérias de uma versão muito bem adaptada de Periféricos ganham formas muito mais elegantes em comparação ao filme Jogador nº 1, por exemplo, no qual igualmente há metaverso, relações humanas complexas (offline, no caso) e escolhas de avatares/skins. A todo momento, é possível perceber ares misteriosos, sustentados pela lore da série, que ela está tratando de assuntos seríssimos e delicados. E o caminho tomado é o de sempre trazer boas referências de ficção científica não só das mídias similares (cinema e TV), mas de livros, quadrinhos e jogos também.

Colírios do metaverso

Você pode achar tudo de Periféricos, exceto que é uma série feia esteticamente. Sua paleta de cores, filtros, jogo de luzes em cenas específicas e pós-produção a deixa extremamente bela visualmente. Movimentos de câmera também ressaltam personagens e fazem com que embates de diálogo e de lutas se tornem bastante interessantes aos espectadores, salvo alguns cortes excessivos em alguns poucos momentos. 

Imagem de periféricos (prime video) - a atuação de cherise nuland está incrível em periféricos. Ela faz o papel da poderosa antagonista t'nia miller (reprodução/amazon studios)
A atuação de Cherise Nuland está incrível em Periféricos. Ela faz o papel da poderosa antagonista T’Nia Miller (Reprodução/Amazon Studios)

É impressionante perceber como a direção de arte está constantemente preocupada em criar diferenças entre realidade e os diversos tipos de metaverso disponíveis em suportes tecnológicos dessa época. Enquanto Flynne utiliza seu aparelho de última geração para entrar num mundo completamente similar ao real, incluindo as sensações de todos os sentidos humanos, Corbell Pickett (um dos antagonistas, interpretado por Louis Herthum) usufrui de seu conjunto de sensores que dão acesso a um metaverso com cores saturadas e personagens não-jogáveis nada convincentes, ainda que bem realistas.

Além disso, a série mostra grande elegância ao estruturar cenas em cada situação diferente, traçando toda uma narrativa em cronologia linear e usando poucos recursos de previsão ou de flashbacks. Essa maneira de contar a história instiga cada vez mais, prendendo os espectadores à tela.

Verossimilhança? Certamente.

Periféricos está sempre “pisando em terreno fértil, sólido e muito agradável” de William Gibson, mas certamente tem um pé na realidade em que vivemos contemporaneamente. Muito conscientes e inteligentes, por sinal.

A série trata de temas mais ou menos complexos, desde teorias da Física relacionadas à Teoria da Relatividade e tunelamento quântico até conceitos de Dark Web e a forte presença das impressoras 3D em ambientes mais comuns a nós. Esses e diversos outros temas e objetos – que podem muito bem virar realidade daqui a alguns anos – nos colocam com os pés no chão, mas, ao mesmo tempo, dão asas à imaginação mais perversa possível. É aí que as ficções científicas dão o seu ar da graça, encantando e aterrorizando.

Imagem de periféricos (prime video) - chloë grace moretz está espetacular no papel de flynne fisher (reprodução/amazon studios)
Chloë Grace Moretz está espetacular no papel de Flynne Fisher (Reprodução/Amazon Studios)

Além disso, sua maior crítica, provavelmente presente no livro também, é magnífica, mantendo seu teor verossímil ao nosso presente e atentando a possíveis futuros muito sombrios, cujos costumam ser ignorados com frequência por boa parte do mundo. O próprio fracasso à vista do metaverso é um exemplo concreto do quão podemos estar reféns de tecnologias impostas por big corps muito mal-intencionadas, que levam a humanidade a um precipício sem fim de solidão, de segregação social e de ausência de direitos humanos. 

Quem se lembra dos divertidos experimentos de Ryan Trahan, famoso YouTuber, inclusive? Pois é, Flynne tem alguns efeitos colaterais muito similares aos dele em alguns episódios e até problemas físicos muito piores (sem spoilers, isso fica para que você descubra ao assistir) ao usar o aparelho de Realidade Virtual por tempo prolongado.

Imagem de periféricos (prime video) - jack reynor é o irmão de flynne, burton fisher, na série e também está performando muito bem (reprodução/amazon studios)
Jack Reynor é o irmão de Flynne, Burton Fisher, na série e também está performando muito bem (Reprodução/Amazon Studios)

Os clássicos elementos do cyberpunk (ou de futurismos pessimistas) também estão presentes em todos os momentos e dão um frescor muito bom à série, traçando paralelos de decadÊncia e corrupção em relação ao que já temos hoje: justamente o início do metaverso e armas tecnológicas muito avançadas – e perigosas demais, como drones paramilitares.

Imagem de periféricos (prime video) - um dos grandes vilões, corbell pickett (louis herthum) ajudam a te interessar cada vez mais na narrativa (reprodução/amazon studios)
Um dos grandes vilões, Corbell Pickett (Louis Herthum) ajudam a te interessar cada vez mais na narrativa (Reprodução/Amazon Studios)

Embates políticos tensos e lutas/tiroteios entre big corps tiranas e poderosas, seus aliados e o pessoal de Flynne ajudam a intensificar as envolventes tramas e narrativas, além de incríveis cenários extremamente belos com e sem CGs absurdas de bem feitas que conquistam pouco a pouco a atenção de quem assiste. 

É uma perspectiva muito única criada à série que dificilmente será replicada. Fazer uma Londres futurista, com imensos arranhas-céus em forma de estátuas greco-romanas clássicas, robôs que podem simular a voz e o rosto de pessoas reais (até as mortas) e possibilidades de cura reais a doenças terminais com certeza vão encantar e convencer diferentes públicos.

Conclusão

Com exceção do fato de que cada episódio tem uma hora de duração, Periféricos é uma série perfeita! É raro encontrar produções do nível que ela está alcançando no momento, se mantendo sempre envolvente e instigante, como bons clássicos da ficção científica. E você vai esperar ansiosamente pela continuação da sua história. Ou não (e está tudo bem).

Periféricos também tem potencial de se tornar apenas um clássico cult do catálogo Prime Video, já que busca capturar os fãs mais assíduos de ficção científica e de obras adaptadas de William Gibson, que já podem ser de um público muito nichado por si só. Seu triunfo pode ser realmente meteórico e deixar de ser lembrado no longo prazo. E, novamente: a duração dos episódios em nada contribui para seu sucesso estrondoso – uma saída agradável seria dividir o tempo de cada capítulo em meia hora e soltá-los com maior frequência no catálogo (?). Todavia, é uma série muito respeitável em todos os seus aspectos audiovisuais e narrativos.

A direção de arte, a cenografia, as atuações, a pós-produção, os efeitos visuais… Tudo parece incrível em demasia no novo título da Amazon, a qual parece se destacar constantemente em comparação a qualquer série relevante hoje. Não à toa, é possível capturar a essência de grandes produções que a grandalhona bilionária tem lançado, tais como a recente O Senhor dos Anéis: Os Anéis de Poder. É muito perceptível o dinheiro investido em todos os seus detalhes construídos.

Se você busca muita ação, tramas subversivas e questões “cabeçudas” para refletir seu dia a dia muito relacionado às tecnologias emergentes, Periféricos com certeza é para você. E tudo, absolutamente tudo carrega narrativas e críticas políticas. Com esse título não é diferente. Suas mensagens têm sido muito interessantes até o momento e estamos ansiosos para ver o desenrolar de tramas tão provocativas e cativantes.

Periféricos, que já tem 6 episódios, está disponível no Prime Video. Sua primeira temporada vai contar com oito episódios até o dia 9 de dezembro. Recomendamos fortemente!

Veja também:

Lançamentos do Amazon Prime Video em novembro de 2022: Jogo da Corrupção e mais

Os melhores sites para assistir filmes online grátis em 2022


Fonte: IMDb, Amazon Studios

9/10
Total Score
  • Direção
    10/10 Excelente
    A direção equilibra muito bem as cenas de ação e de diálogos, geralmente as mais lentas. Consegue surpreender por cenas e cenários muito bonitos, com uma CG incrível que fundamenta e reforça o tempo todo a história da série e seu universo.
  • Roteiro
    10/10 Excelente
    O roteiro tem caprichado e contribuído demais para a série. Tudo parece muito bem escrito e organizado entre cada cena, enaltecendo diálogos intensos e justificando conflitos existentes.
  • Fotografia
    10/10 Excelente
    É um dos pontos mais altos da grande produção. As imagens e os cenários são incríveis e tiram o fôlego facilmente. Seus filtros e paletas de cores também são muito únicas e impressionantes.
  • Trilha Sonora
    8/10 Ótimo
    Cumpre bem seu papel, mas não é nada acima do esperado, ou seja, passa as emoções corretas nos momentos certos e reforça a energia ficcional e tecnológica da produção. Ajuda muito quem assiste a imergir no seu mundo, mas, mesmo assim, não se destaca.
  • Atuação
    9/10 Incrível
    Todos os atores e atrizes estão excepcionais. Alguns coadjuvantes deixam a desejar em pouquíssimos momentos, porém não é nada que impacte negativamente no conjunto da obra.
1 comentário
  1. Essa série é fantástica! Prende do início ao fim e nos convida à reflexão de um futuro não muito bonito para a raça humana…
    Com relação à duração dos episódios, eu achei normal, estou acostumada a maratonar séries e a duração é essa mesmo – e no caso dessa série em questão, comigo já acontece o contrário, o episódio acaba e eu já acho que foi rápido demais, de tão entretida que eu estou.😉
    Essa série tbm é puro ritual gemátrico, assim eles geram o intento egregorizado do que eles querem fazer com a humanidade. Se observar bem, ultimamente uma grande parte das séries e filmes estão sendo assim, pura gematria, afinal, quem as financia são os mesmos que controlam essa agenda. 😉

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