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Black Mirror estreou em 2011, mas não fez tanto barulho quanto recentemente, quando a terceira temporada chegou à Netflix. E não é por menos: a série alcança o seu ápice, com seis histórias intrigantes sobre como a tecnologia e a sociedade podem se moldar de maneiras assustadoras.
Seu sucesso tem muito a ver com a angústia que o telespectador sente ao fim de cada episódio. É um efeito causado não só porque os personagens e os roteiros são envolventes, mas, principalmente, porque tudo parece ser possível de acontecer. A verdade é que várias invenções e situações apresentadas na série têm raiz no mundo real. Mesmo as histórias mais impressionantes podem ser comparadas com situações do cotidiano ou com pesquisas científicas em curso.
Abaixo, você confere alguns dos melhores episódios da nova e das velhas temporadas de Black Mirror, com um resumo de cada história. Fica como uma lista dos episódios que mais valem a pena serem assistidos, e também os mais próximos da nossa realidade. A partir daqui, cuidado com os spoilers:
Hino Nacional
O primeiro episódio de Black Mirror não tem nada de ficção científica, mas compensa com uma similaridade chocante com a realidade. Em “Hino Nacional”, o primeiro ministro do Reino Unido precisa fazer sexo ao vivo com um porco em rede nacional para salvar a vida da princesa real. No final, ele decide fazê-lo, e os sequestradores libertam a prisioneira antes da transmissão da cena para todo o país – que acontece mesmo assim, porque a população inteira já estava vidrada na TV.
É uma crítica forte ao sensacionalismo da televisão moderna, porque mostra que a população fez questão de assistir ao “espetáculo”. Curiosamente, meses depois do episódio ir ao ar, o primeiro-ministro David Cameron foi alvo de uma polêmica de tabloides, que o acusaram de ter relações sexuais com um porco.
Quinze milhões de méritos
Em um futuro alternativo, pessoas são obrigadas a pedalar em bicicletas ergométricas para acumular pontos e poder ter a chance de participar de um reality show para escapar da prisão. Sua única chance de ter uma vida de luxo é tentar a sorte em uma espécie de The Voice, desde que tenham energia suficiente para pedalar sem parar.
Apesar de reality shows serem populares, o que mais chama atenção são meios já existentes para gerar valor pedalando. Apps como o Pact permitem ganhar dinheiro com isso. E existe até um gerador inteligente que produz energia com uso de bicicleta. O que mais se aproxima de Black Mirror, porém, é uma iniciativa da prisão de Santa Rita do Sapucaí, em SP. Nela, presos podem reduzir um dia de pena a cada três que pedalam para gerar energia limpa.
Toda a sua história
Neste episódio, vemos um futuro onde lentes de contatos que gravam tudo o que você vê e dão replay em memórias, sempre que desejado. A história envolve brigas alimentadas por lembranças que não se vão nunca – não importa que você tenha perdoado alguém, o erro sempre estará lá para ser visto de novo.
Hoje, apesar do Google Glass ter dado errado, já existe um novo postulante a óculos armazenador de memórias: o Spectacles, do Snapchat. Lançado nos EUA, ele já começa a ser usado para gravar vídeos e postar na rede social, sem precisar usar o celular o tempo todo. É um projeto ainda nos estágios iniciais, mas que pode muito bem evoluir a um nível Black Mirror de esquisitice.
Volto já
Volto já é uma história com bastante ficção científica e questionamento existencial. Mas, curiosamente, é um dos poucos episódios da série com clima alto-astral. Nele, o namorado da protagonista morre, mas ela o “ressuscita” em forma de inteligência artificial graças a um serviço inovador.
Embora a tecnologia mostrada no episódio pareça ser avançada demais, já existem projetos que pretendem emular pessoas a partir de seu histórico nas redes sociais. Foi o que fez a cientista russa Eugenia Kuyda, que criou um bot para imitar seu amigo falecido por meio de dados disponíveis publicamente na web. Isso sem falar em uma tecnologia desenvolvida pela Adobe, conhecida como um “Photoshop para voz”: com uma amostra de alguns minutos de áudio de alguém, o software consegue falar qualquer frase usando a mesma voz. Não é difícil imaginar uma inteligência artificial que tire proveito disso para reviver digitalmente uma pessoa morta.
Urso Branco
No segundo episódio da segunda temporada, uma mulher acorda sem memória em um mundo perturbador. Assassinos a perseguem com armas enquanto outras pessoas só observam e filmam com seus celulares. Ela foge com uma aliada para um local misterioso, só para descobrir que tudo se trata de encenação. A mulher, na verdade, é uma assassina prisioneira de um parque temático feito para torturar criminosos.
Ainda não existem parques do tipo em 2016, mas é fácil relacionar o episódio com casos de “justiça popular”. Embora estejamos no século XXI, ainda há quem ache que crimes devam ser pagos na mesma moeda, olho por olho, se possível ainda filmando a barbárie. Exatamente como em Black Mirror.
Momento Waldo
A história envolve um desenho animado dublado por um comediante que vira paixão nacional. Criticando políticos tradicionais com uma linguagem pouco amistosa, o personagem se candidata a um cargo eletivo mesmo não tendo qualquer qualidade política para isso.
O episódio não é nem de longe um dos mais inquietantes de Black Mirror, mas só até percebermos suas semelhanças com a campanha de Donald Trump. Assim como Waldo, o bilionário não fala nem age como político, e colecionou votos justamente pela postura extremada e imprópria. Como Waldo, ele não parecia real, mas acabou provando o contrário.
Natal
Em Natal, Matt é um interrogador que tenta arrancar uma confissão de um assassino em troca de sua própria liberdade. A história gira em torno de lentes de contato inteligentes que permitem bloquear pessoas na vida real, com imagens borradas e vozes distorcidas. O final é impactante: mesmo livre, Matt é bloqueado para todo mundo, e não pode interagir com ninguém.
Parecido com Toda a Sua História, esse episódio mostra não só o poder de lentes e óculos como o Spectacles. A crítica parece ser voltada a interações em redes sociais, em que pessoas só se mantêm visíveis para quem querem, e bloqueiam as indesejadas. Ao extrapolar esse mesmo comportamento para fora do celular, tudo parece mais assustador.
Queda livre
Talvez o mais famoso episódio da terceira temporada, Queda Livre mostra a história de uma sociedade que dá importância excessiva à reputação em redes sociais. As pessoas são valorizadas de acordo com suas notas públicas, que servem inclusive de moeda de compra e venda. No fim, a protagonista chega ao fundo do poço, mas parece perceber o valor real das coisas.
Esse tipo de comportamento já é atual para muitas web-celebridades, que fazem de tudo por um like. Porém, algo ainda mais impressionante vem acontecendo na China: o governo do país quer implementar um ranking de pessoas baseado em “bom comportamento”. Quem atender certos requisitos e for bem avaliado ganha créditos para gastar.
Versão de testes
No terceiro episódio da segunda temporada, um homem que precisa de dinheiro com certa urgência se submete a cobaia de um videogame experimental. A máquina se liga ao cérebro para aprender os maiores medos do jogador e levá-lo a cenários de realidade virtual extremamente reais. A ideia é criar o maior terror possível.
A história é facilmente relacionada com jogos de terror de realidade virtual. Porém, a cereja do bolo é um projeto do MIT que quer ensinar uma inteligência artificial a assustar humanos. Você mesmo pode ajudar apontando quais imagens geradas pela máquina são mais medonhas para você. Quem sabe, em breve, robôs saibam de fato quais são nossos maiores medos.
Manda quem pode
O episódio considerando por muitos o mais perturbador de toda a série é sobre hackers e humilhação pública. Um garoto tem o laptop infectado por malware, e criminosos o filmam se masturbando. Ameaçando liberar o vídeo na web, obrigam o rapaz a assaltar um banco e até a matar um homem. No final, a gravação é publicada mesmo assim, revelando o lado pedófilo da vítima.
Junto a Hino Nacional, essa é uma história que pode acontecer com muita gente hoje mesmo. Todos os perigos e tecnologias mostrados ali já existem, incluindo pessoas que gostam de humilhar outras publicamente – você certamente já ouviu falar em casos de suicídio de moças que tiveram vídeos íntimos vazados. Isso sem falar no perigo de hackers bisbilhotando sua webcam – Mark Zuckerberg que o diga.
San Junipero
A única história de Black Mirror com um final feliz de verdade, San Junipero conta a história de duas moças que se apaixonam dentro de um mundo virtual. No futuro, as pessoas podem viver livremente nesse lugar artificial, e até manter a mente viva após a morte. No caso de uma das personagens, porém, a experiência serve para experimentar a vida que ela não teve no mundo real.
A ciência ainda está longe de conseguir transportar o cérebro humano para dentro de um computador. Porém, esse é um objetivo real, como bem exemplificam projetos como o Human Brain Project. Além disso, a série faz lembrar muito bem mundos virtuais como Second Life e InWorldz, que são muito usados por pessoas com deficiência para saírem da cama sem de fato fazê-lo.
Engenharia Reversa
Em um futuro pós-apocalíptico, super soldados têm implantes no cérebro para ajudar na batalha contra criaturas que ameaçam os humanos. Elas seriam como zumbis, surgidas a partir de pessoas contaminadas com um vírus. O soldado, porém, eventualmente descobre que tudo é uma armação do governo para facilitar o assassinato de gente de verdade.
É impossível não pensar nas iniciativas de super soldados Nett Warrior, dos EUA; e FELIN, da França. Mas, além disso, o episódio faz referência a outro aspecto da realidade que infelizmente permanece atual: na ficção, os soldados matam pessoas com defeitos genéticos, com o objetivo de “limpar” a raça humana; nada diferente da eugenia pregada por grupos neonazistas que seguem vivos nos EUA e na Europa.
Odiados pela Nação
No último episódio da terceira temporada, algumas pessoas começam a morrer misteriosamente depois de serem atacadas nas redes sociais. Investigadores descobrem que um hacker tomou o controle de abelhas-robôs e passou a provocar a ira da internet para criar novos alvos e eliminá-los silenciosamente.
A história faz clara referência aos trolls do Twitter, 4chan e outras redes sociais e fóruns online. Eles já odeiam pessoas gratuitamente, xingam como se não houvesse amanhã, e não medem as consequências de nada. Para completar, um time de engenheiros de Harvard já desenvolve drones em formato de abelhas há cerca de 10 anos. O objetivo dos robôs voadores parece ser o mesmo da série: ajudar na polinização, mas também ajudar o governo a vigiar os cidadãos. Fica a torcida para que as máquinas em formato de abelhas sejam, pelo menos, à prova de hackers.
Gostou? O que você está achando de Black Mirror? Para quem não conhece, a série está disponível através do serviço de streaming Netflix.
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