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A Guerra na Ucrânia completa 1 ano sendo o maior conflito bélico do Ocidente nesse século e com questões complexas como as motivações reais russas, o apoio da OTAN à Ucrânia e a difícil visualização de um acordo de paz efetivo, além, é claro, do enorme receio da escalada para um conflito maior ainda.
A complexa relação entre Rússia e Ucrânia
Em 24 de fevereiro de 2022, Vladimir Putin enviou 200 mil soldados em uma operação especial que tinha como propósito derrubar o governo de Kiev. O presidente russo imaginava que suas forças iriam realizar essa missão em algumas semanas, mas encontrou forte resistência dos ucranianos, fazendo o conflito escalar para uma guerra que perdura até hoje e tem deixado algumas frustrações para os russos.
No começo do conflito, embora o ataque fosse reconhecido como não justificável por quase todos os atores internacionais, os motivos que o Kremlin usava para embasar suas ações eram dúbios e duvidosos, de forma que parecia que Putin escondia suas reais motivações ou não se preocupava em se justificar para a Comunidade Internacional.
A questão da Rússia com a Ucrânia não é algo novo, e surge em 1991 com o fim da URSS — União das Repúblicas Socialistas Soviéticas — e a então separação da Rússia e da Ucrânia. Dentro da URSS, a Ucrânia sempre foi uma das regiões mais ricas e poderosas, inclusive sendo detentora de um pesado armamento nuclear. Em 1990 a terceira potência nuclear mundial não era a China ou a França, mas sim a Ucrânia.
Com o fim da URSS, a Ucrânia herdaria um enorme arsenal nuclear, mas abriu mão desse no Memorando de Budapeste, tratado onde negociou sua independência como Nação entregando esse arsenal e aderindo ao Tratado de Não Proliferação de Armas Nucleares (TNP).
Em troca, os governos da Rússia, dos EUA e do Reino Unido se comprometeram a “respeitar a independência, a soberania e as fronteiras existentes da Ucrânia” e a “abster-se da ameaça ou do uso da força”.
Na época essa negociação era extremamente importante, porque firmava a Ucrânia como uma nação independente negociando com grandes nações, o que a colocava como participante da Comunidade Internacional.
Em 1996 todo o armamento nuclear já tinha saído do território ucraniano e sido devolvido a Moscou.
A questão da Crimeia
Foi em 2014 a primeira vez que o Memorando de Budapeste foi rasgado, e isso aconteceu em um conflito que pode ser visualizado como a ponta do iceberg do que acontece atualmente.
A Crimeia é uma região do tamanho de Alagoas que fica ao Sul da Ucrânia e Sudoeste da Rússia. A região foi oficializada como território sob governo ucraniano no Memorando de Budapeste, mas após uma série de crises políticas internas entre a Crimeia e a Ucrânia, um referendo – não validado pela Comunidade Internacional – fez com que a Crimeia se tornasse território russo e fosse então anexado em março de 2014, sendo essa anexação também não reconhecida pela ONU e principais Estados da Comunidade.
Com essa anexação, a Rússia agiu contra o Memorando de Budapeste, gerando repúdios internacionais que não pareceram incomodar o Kremlin.
Ainda em 2014, o presidente ucraniano Viktor Yanukovich foi deposto pelo parlamento. Viktor tinha um alinhamento político importante com o governo russo, e a sua deposição pelo parlamento colocou a Ucrânia em uma posição que o Kremlin não queria, que era um alinhamento com a Europa e o Ocidente.
A questão da Crimeia foi e ainda é causa de discussões internacionais pela irregularidade da anexação, gerando comoção e sanções por parte do Ocidente, mas o fato é que de 2014 até o início da guerra, houveram diversos atritos entre os países, principalmente ataques russos.
As motivações públicas Russas
De 2014 até 2021, era muito pouco provável até mesmo para a Comunidade Internacional que a Rússia de fato invadisse a Ucrânia. A situação entre os países foi ficando cada vez mais tensa e com escaladas como a situação onde a Rússia apoiou movimentos separatistas em regiões da Ucrânia – províncias de Donetsk e Lugansk – mas até poucos dias antes o Kremlin negou de todas as formas que fosse realizar qualquer operação militar em terras ucranianas.
Essas negativas iam em desencontro com as movimentações de tropas russas, que então no dia 24 de fevereiro saíram de todas as direções com destino a Ucrânia, mas quais as motivações dadas pela Rússia nessa época?
- “Desnazificação” da Ucrânia
Uma das justificativas utilizadas por Putin para a operação militar na Ucrânia, é a “desnazificação” da Ucrânia. Segundo o líder do Kremlin.
“Tomei a decisão de realizar uma operação militar especial. Seu objetivo será defender as pessoas que há oito anos sofrem perseguição e genocídio pelo regime de Kiev. Para isso, visamos a desmilitarização e desnazificação da Ucrânia.”
Putin, na declaração da operação militar
Acontece que, embora a Ucrânia concentre sim alguns casos de nazismo tanto em seu exército quanto em meio aos civis, essas justificativas de nazismo no governo ucraniano até hoje não foram comprovadas, sem contar que o presidente ucraniano, Volodymyr Zelensky é judeu.
Os analistas internacionais consideram essa justificativa como uma fala interna, para Putin justificar seu ataque para uma massa russa, embasando seus ataques como se a Rússia estivesse, mais uma vez, combatendo os nazistas, como aconteceu na segunda guerra.
“Você diz que somos nazistas, mas como um povo pode apoiar os nazistas sendo que demos mais de oito milhões de vidas pela vitória sobre o nazismo?”
Zelensky em um discurso televisionado, fazendo referência às disputas da Segunda Guerra Mundial.
- A proximidade da Ucrânia com a OTAN
Algo sempre incomodou a Rússia em relação à Ucrânia: a proximidade da nação com o Ocidente, em vias políticas e também econômicas.
Essa proximidade chegou ao máximo quando a OTAN oficializou um convite de adesão à Ucrânia, e isso sempre foi considerado inaceitável pelo Kremlin.
“A relação da Otan com a Ucrânia será decidida pelos 30 aliados da Otan e a Ucrânia, e ninguém mais”
Stoltenberg, Secretário Geral da OTAN
Basicamente, a Organização do Tratado Atlântico Norte é um tratado militar entre países ocidentais que faz com que qualquer nação da OTAN que seja atacada, gere imediatamente reação aos outros países membros.
De forma resumida, atacar um país da OTAN, é atacar todos os países da OTAN. Mas outro ponto importante é que, caso a Ucrânia fizesse parte da OTAN, países como os EUA poderiam colocar bases militares na vizinhança russa, o que sempre foi algo fora de cogitação para os russos.
Os russos inclusive colocaram como inadmissível que a Finlândia e a Suécia façam parte da OTAN, lembrando que ambos países têm importantes fronteiras com a Rússia.
“Nós demos os nossos avisos, tanto publicamente como pela via dos canais bilaterais; eles (os dois países) sabem disso, então não há surpresas. Eles foram informados sobre tudo, sobre o que (uma eventual adesão à OTAN) vai acarretar”
Maria Zakharova, uma porta-voz do Ministério de Relações Exteriores do governo da Rússia.
Ainda em 2022, durante o Conselho Europeu de 23 de junho de 2022, os dirigentes da UE concederam à Ucrânia o estatuto de país candidato à adesão à UE, o que oficializaria o sonho ucraniano de ser um país, de fato, europeu no papel.
Tudo isso deixava a Ucrânia muito distante da Rússia, em todos os âmbitos, portanto sendo uma das justificativas da Rússia para o ataque.
A Ucrânia
Quando a operação foi anunciada pelo Kremlin, Zelensky se negou a fugir de Kiev, como sugeriram seus aliados. Ao longo dos primeiros meses, a Ucrânia ficou sozinha nesse conflito, já que provavelmente nem os ucranianos esperavam que fossem resistir por tanto tempo.
Nas primeiras semanas o Ocidente ficou cauteloso em relação a qual tipo de apoio poderia dar a Kiev, por dois principais motivos: As ações da OTAN poderiam desencadear uma terceira guerra mundial, e a dependência que os países europeus tinham do gás russo.
Por isso, parecia por um instante que a Ucrânia havia sido deixada para trás e em poucas semanas o governo de Kiev cairia, mas não foi bem assim que aconteceu.
Zelensky se manteve em Kiev desde o primeiro dia do conflito, e embora a Rússia tenha tomado territórios importantes como Mariupol, hoje o ataque russo é considerado um certo fiasco, visto que o governo de Kiev ainda resiste e as tropas russas já foram até mesmo expulsas de alguns lugares antes conquistados.
Essa resistência dos ucranianos e resiliência em sobreviver e resistir aos russos foi aos poucos tornando inadmissível para o Ocidente não colaborar, afinal um dos principais motivos que justificaram o ataque era justamente a proximidade da Ucrânia com o Ocidente.
No começo do conflito um dos motivos dos países da Europa não se envolverem era o gás russo, já que a Europa era quase toda – principalmente Alemanha – dependente do gás da Rússia para sobreviver. Já os Estados Unidos da América não queriam evoluir um conflito local para uma terceira guerra mundial, o que fez com que a OTAN limitasse seu apoio a princípio com tímidas quantias, até porque, a Ucrânia não faz oficialmente parte da OTAN.
Mas os ucranianos foram persistentes em angariar apoio para sua causa, e o que antes se limitava em apoio financeiro, hoje já se tornou apoio bélico de armamento pesado. Recentemente os países da OTAN anunciaram o envio de tanques de guerra de ponta para a Ucrânia, o que reanimou e deu sobrevida aos ucranianos para iniciar uma nova fase do conflito.
Muitos analistas questionam se no momento, a Ucrânia não funciona somente como uma forma da Rússia testar as forças da OTAN, e por esse ponto de vista a Ucrânia tem resistido muito bem, já que a expectativa russa era de depor o governo de Zelensky em poucas semanas.
Todavia, a situação para a Ucrânia não é boa. São atualmente mais de 200 mil mortos entre civis e soldados – a Rússia contabiliza 150 mil, por aí -, uma economia colapsada e milhares de refugiados. A situação realmente só não é mais crítica graças ao apoio da OTAN.
Na última semana, inclusive, pela primeira vez desde o início do conflito, Joe Biden, então presidente dos EUA visitou o país e aproveitou a ocasião para anunciar mais apoio financeiro e militar. Dias depois, na Polônia, Biden declarou que os EUA estarão com a Ucrânia “sem vacilar”.
Propostas de paz não avançam
Após um ano de conflito as tratativas para um acordo de paz tem sido pouco efetivas, principalmente por parte da Rússia. Sendo Putin um imperialista, sair da Ucrânia, um país muito menor e mais fraco em questões militares, sem o que desejava, seria um fracasso monumental que prejudicaria sua imagem internamente.
Vale lembrar que a mídia russa trabalha quase em uma realidade alternativa onde segundo os russos, a OTAN é quem levou a situação a esse nível, e o Kremlin somente está defendendo seu território.
Todavia, as tropas russas operam em baixa já a alguns meses. Não se esperava que a Rússia tivesse tanta dificuldade para avançar na Ucrânia, mas a realidade é que os ucranianos já chegaram a retomar alguns territórios.
Isso considerando que no início do conflito a Ucrânia foi deixada à própria sorte, mas hoje conta com um apoio cada vez mais expansivo da OTAN.
Os países ocidentais tentam ajudar enquanto buscam também evitar uma escalada no conflito, afinal qualquer crescente poderia colocar a Europa ou mesmo os EUA em um conflito direto com a Rússia, o que pelo menos um dos lados aparenta não querer.
Revisado por Glauco
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