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Em uma conferência realizada hoje, 29, o bilionário Elon Musk revelou, pela primeira vez, o Neuralink, produto originado da empresa homônima que consiste de um chip com eletrodos a serem implantados no cérebro de um paciente, com o objetivo de corrigir e curar problemas motores e doenças neurológicas.
Mostrado em pleno funcionamento — o Neuralink estava implantado em uma porca chamada “Gertrudes” –, o dispositivo gozava de uma conexão sem fio a um computador, que exibia picos de atividades do animal, enquanto este chafurdava no feno de sua pequena jaula. Elon explicou que a ideia é que esses sinais possam ser monitorados pelo próprio implante, que identificará a origem e possíveis razões para picos e quedas, alertando o usuário de medidas recomendadas por meio de um app de smartphone, por onde o Neuralink se conecta via bluetooth.
Em outras palavras: seu cérebro, na tela do seu celular.
Evidentemente, isso tudo ainda está bem longe de se tornar realidade, mas o líder da Neuralink (e da Tesla, e da Space X, e da Boring Company) anunciou durante a apresentaçao que a Food and Drug Administration Agency (FDA), que controla a regulamentação de saúde e outros programas nos Estados Unidos, já garantiu à empresa uma permissão de testes designada para “dispositivos revolucionários”.
Neuralink, o implante
Durante a apresentação, Elon Musk também dedicou um tempo para descrever o dispositivo: à primeira vista, ele não é muito maior do que uma moeda — salvo pelos fios incrivelmente finos que, segundo o CEO, são inseridos dentro do cérebro.
A operação é relativamente simples de se entender: um cirurgião, assistido por um robô, abre um pequeno pedaço da cabeça do paciente, remove o escalpo e o osso, posicionando o implante na cavidade. Fecha-se tudo com super cola — o mesmo tipo usado em hospitais — e o paciente é liberado para seguir seu caminho. Por mais perigoso que isso possa soar por nosso texto, Musk assegura que o procedimento não leva mais que uma hora, não necessita nem de uma anestesia geral, e o implante fica imperceptível, escondido sob a pele.
Ainda sobre o procedimento, Elon Musk esclareceu que ele é facilmente reversível ou aprimorado (em caso de necessidade de troca do aparelho)
“É como se fosse uma FitBit, só que no seu cérebro”, brincou Musk.
Dentro da “moeda cerebral”, porém, há uma tecnologia de ponta: o implante tem, ao todo, 23 x 8 milítmetros (mm) e 1024 canais elétricos por onde passam os sinais cerebrais. A transferência de dados fica na casa dos megabits por segundo (Mbps), mas Elon quer melhorar isso para gigabits por segundo (Gbps) no futuro.
Seus sensores são multidirecionais (vários eixos) e podem fazer leituras relacionadas à temperatura corporal, pressão sanguínea e outras métricas. Finalmente, a bateria do dispositivo dura um dia inteiro, mas ela é autorrecarregável, em um processo que, francamente, Elon não soube explicar muito bem, mas basicamente envolve os próprios sinais cerebrais no processo, durante períodos de baixa atividade (como durante o sono).
Mas o que o Neuralink trata?
A Neuralink (empresa, não confundir com “o” Neuralink, que é o implante) ainda não sabe precisar exatamente quais são os males que o dispositivo pode tratar, mas as apostas são altas: fazendo jus à sua mania de promessas grandiosas, Elon Musk falou desde “paraplégicos voltarem a andar normalmente” até “gerenciar e tratar distúrbios psicológicos como depressão”.
“Uma paralisia é, basicamente, uma série de fios cortados na conexão do cérebro e a medula, certo? Então basicamente, o que o Neuralink faz é criar uma ‘ponte’ que faz essa ligação cortada, permitindo que os sinais elétricos sejam transmitidos e reconhecidos como em qualquer pessoa saudável”.
Elon Musk, CEO da Neuralink
O executivo ainda foi mais além, fazendo promessas que, hoje, não passariam de um roteiro de algum episódio da série Black Mirror da Netflix: “acredito que, no futuro, será possível fazermos o backup de nossas memórias e reproduzí-las conforme necessidade”. Outras piadas feitas por jornalistas presentes, como jogar videogame com a mente, foram entretidas, ainda que humoristicamente, pelo executivo.
Elon Musk ainda não se comprometeu com uma data de lançamento, mas espera que o Neuralink vá custar “alguns milhares de dólares, já com a cirurgia incluída”, mas espera que o custo seja reduzido com o tempo, já que mais e mais pessoas poderão adotar o produto, além do fato de que ele usa componentes comuns a smartphones e smartwatches, que são produzidos na casa das dezenas de milhões de unidades.
Quatro perguntas ainda não respondidas sobre o Neuralink
Apesar de todas as promessas e explicações oferecidas por Elon Musk e toda a equipe, algumas dúvidas ainda permeiam todo o projeto. O que é natural, considerando que estamos falando de um produto nunca antes concebido e que traz promessas grandiosas.
São elas:
- Como é feita a proteção à privacidade do paciente? O Neuralink faz o monitoramento ativo de picos e quedas de atividade cerebral, além de se conectar com smartphones e ser amplamente conduzido por ondas de rádio, tal qual qualquer roteador Wi-Fi ou conector bluetooth. Os dados obtidos por ele podem, pelo nosso entendimento, constituírem informação sigilosa, já que serviriam para ajudar médicos a tratarem condições (dados clínicos são protegidos por lei). A equipe de Elon Musk fez menções a “criptografia de ponta a ponta” e “isolamento de nódulos cerebrais importantes” a fim de evitar que acessos externos tenham êxito. Mas ninguém explicou como.
- O implante será atualizável? Elon Musk fez menção a “upgrades”, dando a entender que será possível aprimorar o Neuralink, mas não explicou se isso seria feito via software ou hardware. O primeiro implica em conceder algum tipo de acesso remoto para a empresa ao seu cérebro, enquanto o segundo traria a necessidade de refazer a cirurgia. Mais além, de que natureza seriam os “upgrades”?
- Qual a resistência do implante? Quando Musk trouxe a porca Gertrudes às câmeras, notamos que o animal estava bem contente, andando por todos os lados e trombando em alguns objetos e cuidadores. Isso levanta a pergunta: qual a resistência física do implante? A empresa limitou-se a dizer que ele é bem robusto, mas qual seria o efeito que ele teria diante de, por exemplo, uma pancada forte na cabeça? Mais além: o implante tem um prazo de validade? Quanto tempo ele aguenta até que você tenha que trocá-lo por outro?
- Como será a entrega do dispositivo? Do ponto de vista de negócios, muitas cirurgias delicadas podem ser ou não cobertas por empresas de planos de saúde. Considerando que nem todos têm acesso a “milhares de dólares” mas o desejo de Elon Musk é o de que o Neuralink seja disponibilizado de forma massificada, como a empresa está antecipando as questões de burocracia, oferta e demanda? Quem poderá comprar o implante e por como ou onde isso será feito?
Todas essas são questões ainda a serem respondidas. Como dissemos, ainda serão necessários alguns anos até que o Neuralink fique sequer pronto para testes humanos, que dirá comercialmente disponibilizado. A apresentação de hoje tinha o intuito de exibir o projeto para o mundo, além de recrutar engenheiros e especialistas para trabalharem na empresa (Elon literalmente disse “nos mandem seus currículos” e disponibilizou um e-mail de recrutamento).
As promessas são várias — e em graus variados. Resta saber até onde a Neuralink conseguirá ir.