Uma equipe internacional de cientistas desenvolveu uma nova tecnologia que pode reorganizar seletivamente as ligações atômicas dentro de uma única molécula. A descoberta permite um nível sem precedentes de controle sobre as ligações químicas dentro dessas estruturas e pode abrir algumas possibilidades interessantes no que é conhecido como máquina molecular ou nanomáquinas. O feito foi realizado por pesquisadores da Universidade de Santiago de Compostela, na Espanha, da Universidade de Ratisbona, na Alemanha, e da IBM Research Europe.
Os cientistas vêm buscando algo chamado “química seletiva” há algum tempo, com o objetivo de formar exatamente o tipo de ligação química entre os átomos que eles desejam. Fazer isso pode levar à criação de moléculas e dispositivos complexos que podem ser projetados para tarefas específicas. Montar esses tipos de nanomáquinas é um trabalho delicado que os autores deste novo estudo comparam a “colocar blocos de Lego em uma máquina de lavar e esperar que os quintilhões de moléculas de alguma forma acabem se montando no produto desejado“.
A pesquisa se concentrou em moléculas conhecidas como isômeros estruturais, que possuem a mesma composição atômica, mas diferentes arranjos de ligações entre esses átomos. Ao usar a ponta de um microscópio de varredura para aplicar diferentes pulsos de voltagem, a equipe mostrou que poderia reorganizar seletivamente as ligações químicas.
Normalmente, os químicos obtêm precisão sobre as reações ajustando parâmetros como o pH, adicionando ou removendo doadores de prótons disponíveis, para gerenciar a maneira como as moléculas podem compartilhar ou trocar elétrons para formar suas ligações.“Por esses meios, no entanto, as condições de reação são alteradas a tal ponto que os mecanismos básicos que governam a seletividade geralmente permanecem elusivos”, observam os pesquisadores em seu relatório, publicado na revista Science.
Essas reações também eram reversíveis, o que significa que a equipe poderia quebrar e formar as diferentes ligações à vontade e, essencialmente, alternar entre estruturas moleculares de maneira controlada. Essa forma de “química seletiva” é descrita como inédita pela equipe. É a primeira vez que, com seletividade, diferentes ligações podem ser formadas em uma única molécula. “Pela magnitude do pulso de voltagem aplicado na molécula central podemos escolher se queremos criar a molécula da direita ou da esquerda [da foto]”, explicou o cientista da IBM Research e autor sênior do estudo, Leo Gross.
A tecnologia permite um controle mais preciso sobre esses tipos de estruturas e pode significar uma verdadeira revolução. “Possíveis tarefas a serem executadas por máquinas moleculares podem incluir o transporte de moléculas ou nanopartículas, a fabricação e manipulação de nanoestruturas e a facilitação de transformações químicas”, disse Gross. “Aplicações futuras podem estar relacionadas a dispositivos moleculares de um único elétron, sistemas nanoeletromecânicos e síntese química”, completa.
Como os testes foram feitos?
A equipe de cientistas utilizou uma substância chamada 5,6,11,12-tetraclorotetraceno (com a fórmula C18H8Cl4), uma molécula à base de carbono que se parece com uma fileira de quatro células de favo de mel ladeadas por quatro átomos de cloro a sobrevoando como abelhas famintas. Introduzindo uma camada do material em um pedaço de cobre frio e incrustado de sal, os cientistas afastaram as “abelhas” do cloro, deixando um punhado de átomos de carbono excitáveis mantendo elétrons desemparelhados em uma variedade de estruturas relacionadas.
Dois desses elétrons em algumas das estruturas se reconectaram facilmente, reconfigurando a forma geral de favo de mel da molécula. O segundo par também estava interessado em emparelhar, não apenas um com o outro, mas com qualquer outro elétron disponível que pudesse passar zumbindo em seu caminho.
Normalmente, essa estrutura instável teria vida curta, já que os elétrons restantes também se juntariam em pares. Mas os pesquisadores descobriram que esse sistema em particular não era comum. Com um leve impulso de voltagem de uma “vara curta” do tamanho de um átomo, eles mostraram que poderiam forçar uma única molécula a conectar esse segundo par de elétrons de tal forma que as quatro células foram puxadas para fora do alinhamento no que é conhecido como alcino dobrado.
Agitados um pouco menos vigorosamente, esses elétrons se emparelharam de maneira diferente, distorcendo a estrutura de uma maneira completamente diferente no que é conhecido como anel de ciclobutadieno. Cada produto foi então reformado de volta ao estado original com um pulso de elétrons, prontos para voltarem novamente em suas configurações em um piscar de olhos.
Ao forçar uma única molécula a se contorcer em diferentes formas — ou isômeros — usando voltagens e correntes precisas, os pesquisadores puderam obter informações sobre o comportamento de seus elétrons, a estabilidade e as configurações preferíveis de compostos orgânicos. A partir daí, seria possível reduzir a busca por catalisadores que pudessem impulsionar uma reação em larga escala de inúmeras moléculas em uma direção, tornando a reação mais específica.
Pesquisas como essa não apenas ajudam a tornar a química mais precisa, como fornecem aos engenheiros novas ferramentas afiadas para fabricar máquinas em nanoescala, deformando estruturas de carbono em formas exóticas que não seriam possíveis com a química comum.
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