Brinquedo radioativo? Conheça o laboratório de energia atômica infantil vendido nos anos 1950. Já pensou em deixar seu filho brincando com uma amostra de urânio 238? Nos anos 1950, com esse brinquedo radioativo, era possível!

Brinquedo radioativo? Conheça o laboratório de energia atômica infantil vendido nos anos 1950

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Já pensou em deixar seu filho brincando com uma amostra de Urânio 238? Nos anos 1950, com esse brinquedo radioativo, era possível!

Quando citamos energia nuclear hoje em dia, mesmo um leigo sabe que os perigos do contato com materiais radioativos podem ser horríveis – mas isso é algo que foi desenvolvido após anos e anos de estudos e, infelizmente, doenças em cientistas. Porém, nos anos 1950, com menos conhecimento sobre essa situação, até mesmo crianças tinham acesso a um “laboratório de energia atômica” como brinquedo.

O brinquedo radioativo dos anos 1950

Laboratório de energia atômica
É inegável o quão bonito o laboratório atômico para crianças era. (Imagem: Reprodução/Sothebyss)

Desenvolvido pela A.C. Gilbert Company, o Gilbert U-238 Atomic Energy Lab (Laboratório de Energia Atômica Gilbert U-238) era um kit vendido com quatro amostras do isótopo estável Urânio 238 – incapaz de realizar reações nucleares, mas ainda radioativo – além de quatro outras amostras de metais de baixa radiação, como chumbo, rutênio e zinco. Completando a parte atômica do pacote, um medidor Geiger-Muller também estava incluindo, para as crianças poderem se divertir fazendo medições de radioatividade nos metais. Pois é.

Vendido por 49 dólares em 1950 – valor que, se corrigido pela inflação hoje em dia, chega aos 600, o brinquedo ficou um ano nas lojas dos EUA, retirado das prateleiras por ser considerado muito caro para as famílias do país na época. 

O kit foi desenvolvido originalmente com intenções educacionais – uma marca da A.C. Gilbert Company e de seu criador, Alfred Carlton Gilbert, que já tinha na época lançado no mercado diversos laboratórios de química infantis com a intenção de mostrar para as crianças como reações ocorriam e afins – mas é um tanto chocante pensar que materiais radioativos realmente estavam disponíveis em prateleiras.

Deixando o choque de lado, porém, é possível ver por meio de imagens dos itens do kit que a intenção realmente era educacional – com a presença de eletroscópio para verificar a carga elétrica dos elementos, uma câmera de nuvens, para as crianças poderem observar a movimentação de partículas alfa, um espintariscópio mostrando os resultados de degradação por radiação e o próprio contador Geiger-Muller, para quantificar a radiação – introduzindo de forma sucinta para quem tivesse acesso ao laboratório de brinquedo os principais pontos do estudo de energia atômica.

Além disso, uma série de recomendações de segurança também acompanhava o laboratório, com a principal sendo a não violação dos recipientes em que as amostras do Urânio 238 estavam armazenados – com a empresa afirmando que eles poderiam aumentar a radiação do laboratório e afetar os resultados do experimento.

Mas existia perigo real no laboratório atômico para crianças?

Brinquedo radioativo
O brinquedo radioativo era vendido em uma simpática maleta. (Imagem: Reprodução/Sothebyss)

Em 2023, com tantos casos de materiais radioativos afetando gravemente a vida das pessoas expostas a eles (nunca esqueceremos a amostra de Césio-137 em Goiânia nos anos 1980), é comum pensarmos que talvez o Gilbert U-238 Atomic Energy Lab seja um dos brinquedos mais perigosos já feitos na história – porém, a realidade é outra.

A revista científica IEEE Spectrum, em 2020, publicou um artigo detalhando e analisando o laboratório, e afirmou que, após análises, a radiação exposta a uma criança que estivesse seguindo as recomendações gerais de segurança nas instruções do brinquedo não era maior do que as de exposição à luz solar durante um dia inteiro – mostrando que, realmente, o fim de sua fabricação tinha mais relação com o alto preço cobrado pelo produto do que por perigos descobertos.

Mas o artigo destaca que o produto era feito para crianças, e todo mundo sabe que regras não são algo exatamente fácil de ser seguido por elas, não é mesmo? Então, por mais que as amostras de Urânio 238 fossem inofensivas na exposição recomendada pelo laboratório, era difícil garantir que uma criança não as removesse de seus contêineres e ficassem com elas por horas no bolso – ou, pior ainda, ingerissem-nas. 

Não há relatos de acusações contra a fabricante sobre complicações causadas para crianças por exposição ao brinquedo – com pouco menos de 5 mil cópias vendidas, quem sabem somente infantes conscientes acabaram tendo acesso ao laboratório –, mas ainda assim é algo que deveria ter sido pensado na época, mesmo que o estudo de radiação ainda não tivesse progredido ao nível de conhecimento que temos em 2023.

Ainda existem kits do brinquedo atômico para venda?

Pesquisando sobre o kit, uma curiosidade muito grande pairou sobre minha mente: será que ainda é possível comprá-lo em 2023? Bom, minha investigação me levou novamente ao artigo de 2020 da IEEE Spectrum, que comenta que existe uma estimativa que dos 5 mil laboratórios fabricados, somente 500 ainda existem em condições completas em 2023. 

Mas se existem 500, é possível que alguns donos vejam nele um estado de raridade, e queiram ganhar dinheiro em cima, certo? Certíssimo, com uma cópia do brinquedo tendo sido vendida recentemente no site Sothebys por US$ 4.800 – algo em torno de R$ 24.472 na cotação atual.

Mas não me dei por satisfeito e continuei procurando. Encontrei informações no site TechCrunch de outra cópia vendida em 2009 por US$ 1.700 (R$ 8.631) no eBay, e, por fim, no site de leilões George Cole Auctions, encontrei uma terceira cópia vendida em agosto de 2022 por um valor entre US$ 1.200 e US$ 1.500 (R$ 6.071 e R$ 7.616)– como não sou morador dos EUA, não tive acesso ao preço exato.

No fim, o que era um brinquedo educacional virou um item de colecionador 70 anos depois, sendo agora muito mais um pedaço de história e da visão do mundo como um todo para a energia nuclear na época do que realmente algo feito para crianças. Dificilmente veremos algo parecido sendo fabricado e vendido nos tempos atuais, deixando ele muito mais como uma curiosidade da evolução científica no último século do que algo que realmente poderia mudar rumos de crianças curiosas.

E se por algum acaso do destino você, leitor desta matéria, seja o dono de um dos 500 kits do laboratório atômico ainda existentes no mundo, recomendamos cuidado – vai saber como as embalagens dos produtos radioativos estão se comportando depois de 70 anos, né?

Veja também

Existe risco em Chernobyl com a invasão da Rússia?

Fonte: IEEE Spectrum, Hypeness, Sothebyss, Techcrunch

Revisão do texto feita por: Pedro Bomfim


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